O estudo conduzido por Camila Nunes Dias para o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela uma prática inédita no mundo do crime organizado: o "censo do crime" realizado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC). O levantamento, realizado quinzenalmente em algumas regiões, busca quantificar não apenas seus membros, mas também os integrantes de facções rivais, classificando-os em categorias como "amigos", "inimigos" ou "neutros". Essa classificação serve a propósitos logísticos e estratégicos, permitindo à facção otimizar a alocação de recursos e planejar sua expansão territorial.
O primeiro censo documentado por Camila ocorreu em outubro de 2016, coincidindo com o início dos conflitos entre o PCC e o Comando Vermelho (CV). Essas facções, que antes mantinham uma aliança estratégica envolvendo a compra conjunta de drogas e armas e a proteção mútua em prisões, romperam sua aliança, desencadeando uma onda de violência nos presídios e nas ruas. Dez meses após esse levantamento inicial, o PCC passou a realizar censos mais detalhados, refletindo sua busca por controle em novas áreas.
O estudo destaca que a estrutura do censo envolve uma hierarquia organizada em que líderes, chamados de "sintonias", em cada presídio são responsáveis por enviar informações sobre membros do PCC e de facções rivais à liderança estadual, que as repassa para a cúpula da facção. Apesar de ser uma prática nacional, a metodologia dos censos varia entre os estados, e a transmissão de dados enfrenta desafios como falta de sinal de celular e a prisão de integrantes-chave.
Uma descoberta notável do estudo é que a expansão do PCC não depende apenas da violência. Ao contrário, a facção opta por uma abordagem estratégica, semelhante à de grandes potências em conflitos internacionais, buscando evitar a exposição excessiva e fortalecer aliados locais. Isso envolve revitalizar áreas enfraquecidas, incentivando o crescimento de negócios ilícitos e evitando confrontos desnecessários que poderiam prejudicar seus interesses a longo prazo.
O censo do PCC faz parte de um projeto mais amplo coordenado pelo Ipea, que visa correlacionar os números do Atlas da Violência com fenômenos específicos do crime organizado. Essa análise busca explicar as variações nas taxas de homicídios em diferentes estados, fornecendo uma visão mais profunda das dinâmicas da violência no Brasil.
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